Em que medida pode uma boa gestão das patentes ajudar ao desenvolvimento económico no pós-crise?
É sabido que as patentes são o principal incentivo para a investigação, nos mais diversos sectores. Nos períodos que se seguem às crises, como a desta pandemia, a investigação é mais necessária do que nunca para se ultrapassarem as questões e problemas colocados. Parece, pois, claro, que as patentes estarão entre os instrumentos mais necessários para o desenvolvimento económico no pós – crise. Sendo as patentes consideradas também produtos de inovação, que podem contribuir para proteger e melhorar as condições de comercialização, diria que é uma vantagem competitiva gerir estrategicamente o portefólio de patentes nos vários mercados onde as mesmas estão protegidas e/ou em fase de proteção. A formulação de um pedido de patente e a sua gestão deverá ser assegurada por profissionais habilitados, que em Portugal são os Agentes Oficiais da Propriedade Industrial.
Como vê a polémica criada à volta das vacinas? Seria útil levantar patentes ou mais conveniente mantê-las mas assegurar a sua produção fora dos laboratórios de origem?
Creio, muito honestamente que é uma falsa questão – ou, pelo menos, um assunto que tem sido desnecessariamente empolado. É compreensível que o tema seja apelativo para os debates políticos e mediáticos. Teríamos, supostamente, um mero interesse económico das farmacêuticas como entrave à necessária produção e distribuição das vacinas em todo o mundo. Começará, desde logo, por se saber de que patentes afinal falamos. Decerto, as vacinas que surgiram, entretanto, implicaram fortes atividades inventivas (realizadas aliás em tempo recorde). Mas, a produção de vacinas não se esgota naturalmente na eficiência (ou não) de patentes que protejam as respetivas formulações. Implica um know-how da empresa (muito além do produto ou processo protegido) e uma capacidade de produção altamente especializada que não está seguramente ao alcance da grande generalidade das empresas farmacêuticas, a nível mundial. Em face do tempo e dos recursos necessários para a criação de novos polos de produção, torna claramente preferível que o fabrico das vacinas seja assegurado pelas empresas que, presentemente, têm já a capacidade para o fazer. Aliás, tirando os exemplos das vacinas Chinesa e Russa, não conheço quaisquer empresas que se tenham apresentado como candidatas ao fabrico e distribuição de vacinas, e que tenham apontado como obstáculo a existência de patentes.
As áreas apontadas como prioritárias no PRR, que serve de guia à aplicação da bazuca europeia, podem abrir oportunidades que dão a esta área um novo fôlego – nomeadamente em matérias ambientais, incluindo hidrogénio verde, mas também ao nível da digitalização?
O fundamental, a meu ver, é que os fundos europeus sejam direcionados para as empresas, em particular para aquelas que se apresentem com projetos de inovação ou de produção credíveis.
O que existe em Portugal nesta matéria é adequado ou devia haver uma aposta maior? O que seria desejável que o governo fizesse para agilizar o tema das patentes?
A legislação existente em Portugal em matéria de patentes é perfeitamente adequada. O organismo nacional responsável pela área – o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) está perfeitamente à altura, em competência e celeridade, para dar conta do desafio. A esse respeito, é em todo o caso preocupante que ao INPI não sejam dadas pela tutela as condições (financeiras) para assegurar aos seus técnicos uma carreira profissional duradoura e compatível com as exigências do cargo.
Em que áreas de negócio são as patentes fundamentais?
Sendo o principal motor (motivação) da investigação, as patentes são indispensáveis, sobretudo, nas áreas técnicas de ponta, em que a atividade inventiva é um fator de concorrência vital.
Quais são os principais desafios e obstáculos a um desenvolvimento adequado nesta área do Direito?
Enquanto advogado, atribuo um papel fundamente à resposta da justiça, que tem como protagonista o Tribunal da Propriedade Intelectual (TPI) e os tribunais superiores que apreciam os recursos das decisões da primeira instância. Parece-me assim indispensável, assegurar uma efetiva especialização dos seus juízes na área da Propriedade Intelectual. Os curtos períodos em que os juízes permanecem no TPI não favorecem, a meu ver, essa especialização. Veria com bons olhos a criação de um segundo TPI (por exemplo, no Porto) territorialmente competente pelos processos de PI na zona norte. Seria útil, também, dotar o TPI de assessores que coadjuvassem os juízes em tarefas instrumentais (mas de enorme importância) na sua atividade jurisdicional.
O empreendedorismo tem sido uma bandeira de Portugal. Pode assumir importância renovada no pós-crise? E que papel ocupa aqui a propriedade intelectual?
Evidentemente que sim, o empreendedorismo pode assumir uma importância renovada no pós-crise, por aqueles que pretendem fazer da incerteza uma oportunidade. A atividade inventiva assume especial importância nestes períodos e numa economia de mercado a inovação não existe sem as patentes.